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Culpa e perfeccionismo em pessoas neurodivergentes: quando a autocobrança se torna inimiga da autoestima

  • Foto do escritor: Luti Christóforo
    Luti Christóforo
  • há 2 dias
  • 2 min de leitura

Por Luti Christóforo – Psicólogo


A culpa é um sentimento que nasce do confronto entre quem somos e quem acreditamos que deveríamos ser. Em pessoas neurodivergentes, ela costuma surgir cedo, ainda na infância, quando comportamentos naturais começam a ser vistos como inadequados e quando a diferença passa a ser interpretada como falha. O resultado é um ciclo de autocobrança que, com o tempo, se transforma em perfeccionismo rígido e exaustivo.


A criança que cresce ouvindo que é distraída, lenta, sensível demais, intensa demais, inquieta demais ou lógica demais internaliza a ideia de que existe um modo certo de ser e que ela não se encaixa nesse padrão. Para não ser criticada, passa a observar cada gesto, cada palavra e cada reação. Aprende a tentar prever o julgamento externo e, antes que ele aconteça, se julga sozinha. Assim nasce a autocobrança. Assim nasce o perfeccionismo.


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Na clínica, acompanhei adultos neurodivergentes que se cobravam duramente por erros mínimos. Pessoas que não conseguiam descansar, mesmo exaustas, porque sentiam que ainda não tinham feito o suficiente. Pacientes que se puniam emocionalmente por se confundirem em tarefas simples, por falarem demais, por falarem de menos, por não conseguirem organizar a rotina ou por demorarem a entender situações sociais. O sofrimento não vinha dos erros em si, mas da incapacidade de se perdoar.


O perfeccionismo, nesses casos, não é busca de excelência. É tentativa de sobrevivência emocional. A pessoa acredita que, se for impecável, ninguém verá suas vulnerabilidades. Se não errar, não será criticada. Se for perfeita, talvez finalmente seja aceita. É uma defesa construída sobre o medo de rejeição.


A psicologia compreende que esse tipo de perfeccionismo é um escudo. Um escudo pesado, rígido e doloroso. Ele protege, mas também aprisiona. A pessoa vive com medo do fracasso, porque interpreta cada falha como prova de incapacidade. Esse excesso de autocontrole mina a autoestima e impede a construção de um senso saudável de valor.


O processo terapêutico busca desmontar esse escudo, peça por peça, até que o indivíduo consiga enxergar que não precisa mais dele. A psicoterapia ensina a reconhecer que a vulnerabilidade não é defeito, é humanidade. Ensina que erros não são vergonhosos, são parte do desenvolvimento emocional. Ensina que autocobrança não gera evolução, apenas esgotamento.


A cura começa quando a pessoa percebe que o padrão perfeito que tenta alcançar nunca existiu. Começa quando ela entende que não precisa se moldar para caber no mundo, mas que pode existir no próprio ritmo, com autenticidade. A autoestima, então, deixa de ser uma métrica de desempenho e passa a ser um exercício de aceitação.


Culpa se dissolve quando há compreensão. Perfeccionismo se enfraquece quando há acolhimento. E a neurodivergência deixa de ser um obstáculo quando é vista como parte da singularidade, e não como um erro a ser corrigido.



Luti Christóforo

Psicólogo clínico

WhatsApp: (41) 99809-8887

Instagram: @luti.psicologo

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