Outubro Rosa e a saúde da mulher neurodivergente
- Dra. Karina Belickas - Mastologista e Coordenadora de Semi Intensiva do Grupo Santa Joana"

- 3 de nov.
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Entrevista: Dra Karina Belickas, médica Mastologista e Coordenadora de Semi Intensiva do Grupo Santa Joana

1. Por que o Outubro Rosa continua sendo uma campanha tão necessária, mesmo após tantos anos de conscientização sobre o câncer de mama?
Resposta: Mesmo com décadas de campanhas de conscientização, o Outubro Rosa continua essencial. Quando o assunto sai da pauta, o cuidado também cai no esquecimento. No Brasil, estima-se que apenas 60% das mulheres com indicação realizam o exame de rastreamento. Por isso, é fundamental manter o tema em evidência, especialmente para que as mulheres que estão entrando na faixa etária recomendada se habituem à rotina de exames preventivos.
Embora o fator genético seja um dos mais determinantes, ele representa apenas cerca de 10% dos casos. A maioria dos diagnósticos está relacionada a fatores genéticos não conhecidos (história familiar positiva), fatores ambientais e hormonais, como idade, obesidade, sedentarismo e consumo de álcool. Por isso, manter hábitos saudáveis e realizar o rastreamento regular são as estratégias mais eficazes de prevenção e diagnóstico precoce.
2. Quais são os principais fatores de risco que aumentam a chance de desenvolver o câncer de mama — e quais deles podem ser evitados com mudanças de hábitos?
Resposta: A predisposição genética é o fator de risco mais conhecido, mas representa apenas uma pequena parcela dos casos apresentam mutações genéticas identificáveis.Nesses casos, o foco deve estar no controle de peso, já que o sobrepeso e a obesidade aumentam o risco de desenvolver e de ter recidiva da doença. Praticar atividade física, manter uma alimentação equilibrada — com menos ultraprocessados e frituras — e evitar o tabagismo e o consumo excessivo de álcool são medidas importantes de prevenção.O uso de hormônios também requer atenção: não é proibido, mas deve sempre ser acompanhado por um médico e realizado pelo tempo e na dose adequados.
3. Muitos acreditam que o câncer de mama afeta apenas mulheres mais velhas. Esse é um mito? Qual é o perfil mais comum das pacientes diagnosticadas hoje?
Resposta: O câncer de mama é mais comum entre mulheres de 45 a 60 anos, mas pode surgir em qualquer faixa etária. Cerca de 12% dos casos no Brasil ocorrem em mulheres com menos de 40 anos.Entre os fatores que elevam o risco estão a obesidade — especialmente após a menopausa — e o histórico familiar de mutação genética. Mulheres com mutações hereditárias tendem a desenvolver a doença mais precocemente e de forma mais agressiva, podendo inclusive estar relacionado a tumores de outros órgãos. Por isso, é essencial que o uso de hormônios, seja para contracepção ou reposição, seja sempre orientado e monitorado por um profissional de saúde.
4. Como o diagnóstico precoce impacta nas chances de cura e na qualidade de vida das pacientes?
Resposta: Todo tumor de mama eu brinco que tem nome e sobrenome. Então os cânceres de mama são diferentes entre si, não são todos iguais e, por isso, o tratamento vai depender do tipo do subtipo desse tumor. Mas além disso a gente também usa o estadiamento inicial para definir o tratamento. E o que seria estadiamento inicial? É o tamanho do tumor na hora do diagnóstico e se existe doença fora da mama: ou linfonodo ou em outra outro tecido, como ossos, fígado, enfim, metástase. Aí, se define o tratamento e com maior certidão o prognóstico. Então a taxa de cura também vai depender disso. As pacientes que tiverem um estadiamento inicial melhor, tumores menores, linfonodos não acometidos e sem doença a distância, vão ter um resultado muito melhor com o tratamento preconizado (quimioterápico, cirurgia, hormônios, imunoterápicos e radioterapia).
5. Além da mamografia, existem outros exames ou sinais aos quais as mulheres devam ficar atentas para detectar o câncer de mama mais cedo?
Resposta: Quando a gente fala de rastreamento, a gente está falando de diagnóstico de um tumor que não é palpável, que não dá nenhum sinal clínico e você faz o exame sem sentir nada. E hoje a mamografia é o principal exame para isso. O ultrassom, dependendo da densidade da mama, dependendo da idade, do histórico familiar, pode ter o seu papel também nesse rastreamento. De novo, existem casos em que há benefício da realização de exames complementares diferentes da mamografia habitual e em idades mais jovens. Mulheres com diagnóstico de mutação genética e nas pacientes que têm o histórico familiar mais importante, é possível realizar calculo
de risco com programas direcionados para identificar aquelas mulheres que têm um benefício maior com a realização da ressonância. Lembrando que um exame não exclui o outro, não é porque fez ressonância que não vai precisar fazer mamografia e vice-versa. Agora, a gente pode fazer um diagnóstico de câncer de mama inicial, não por rastreamento, mas porque deu algum sintoma clínico. E o que a gente vai chamar de sintoma clínico: apalpou um nódulo diferente, percebeu que o volume da mama está diferente do habitual, saída de algum líquido do mamilo, principalmente se for um líquido sanguinolento com translucido, percebeu um aspecto diferente na pele da mama. Então, se você perceber qualquer mudança na mama, também precisa de investigação e aí não vai ser um exame de rastreamento, vai ser um exame diagnóstico daquela alteração que você tá sentindo.
6. De que forma a saúde emocional e o suporte psicológico influenciam o tratamento e a recuperação das pacientes?
Resposta: Tanto o diagnóstico de câncer de mama vai ter um impacto emocional na paciente, porque não é um diagnóstico que nós estamos esperando, é sempre uma surpres. Quanto aos efeitos colaterais, alguns tratamentos físicos e também podem deixar essa mulher debilitada do ponbto de vista emocional. O suporte emocional, nutricional, psicológico, familiar, é fundamental para que seja possível fazer esse tratamento de forma adequada, para que se consiga garantir uma alimentação adequada, um sono adequado, e muitas vezes a mulher sozinha não vai conseguir fazer tudo isso, ela vai precisar de ajuda. Então esse suporte no entorno, para fazer todas essas coisas, para garantir que ela consiga ter o melhor autocuidado, conseguem garantir que ela tenha o melhor resultado com o tratamento que está sendo implementado.
7. Homens também podem ter câncer de mama. Qual é a incidência e como deve ser a atenção masculina nesse tema durante o Outubro Rosa?
Resposta: O câncer de mama pode acontecer em qualquer pessoa que tenha tecido mamário. E os homens têm. A diferença é que o volume de tecido mamário do homem é muito menor e a exposição a estrogênio é muito menor, e ambos estão relacionados com a incidência de câncer de mama. Então, o número de casos de câncer de mama em homens corresponde a 1% de todos os casos. A cada cem casos de câncer, noventa e nove são mulheres e um é homem. E lógico, apesar de não ser o público principal, o homem pode ser surpreendido pelo câncer de mama também. Não existe uma recomendação de que homens façam exames de rotina, até porque, se tiver alguma alteração, essa alteração inicial em homens costuma ser, diferente de mulheres que muitas vezes começa com microcalcificação — por isso é mamografia —, essas
alterações costumam ser rápidas. Então, o homem pode ter sintomas de uma forma mais rápida a partir do início do tumor. Os homens que costumam ter câncer de mama são aqueles que têm uma história familiar muito importante. Então, famílias em que é sabido a presença de algum tipo de mutação, esses homens, se forem portadores dessa mutação, vão ter um risco muito maior do que os homens de uma forma geral. E exposição prolongada a estrogênio também pode aumentar o risco desse homem, e atualmente temos essa situação, quer seja por uso direto de estrogênios, altas doses de progesterona ou obesidade.
8. Como o médico enxerga a importância das campanhas públicas e da comunicação nas redes sociais para ampliar o alcance da prevenção?
Resposta: Uma vez que muitas pessoas não fazem exames de rotina, ou não buscam o médico sem terem sintomas nenhum, as pessoas acabam buscando principalmente pronto atendimento, quando sentem alguma coisa. A campanha que existe hoje sobre o Tubro Rosa nas ruas, nas mídias, é fundamental para que a informação consiga chegar em mais pessoas, inclusive naquelas que não têm acompanhamento regular. Então seria muito mais difícil que você garantisse o maior abrangência do exame, da informação para as pessoas, até procurarem um serviço de saúde quando percebem alguma coisa, se não fossem os veículos de mídia e de informação.
9. Qual é o papel da família e dos amigos no processo de prevenção, diagnóstico e tratamento do câncer de mama?
Resposta: Todo mundo que conhece uma mulher, todo mundo conhece alguma mulher, é importante que relembra essa mulher da importância, porque muitas vezes essa informação não chegou em todo mundo. Então o papel de cada pessoa é poder sinalizar para outras mulheres, para outras pessoas, que existe a importância do rastramento do câncer de mama, porque é um tumor que a gente fala que é muito prevalente, então um homem em cada 8 mulheres vai ter o câncer de mama ao longo da vida, então são muitos e muitos casos, e ter pessoas informadas ao redor possibilita que essa informação vá além das mídias, então lógico que as mídias ajudam, os médicos que fazem os acompanhamentos de rotina ajudam, mas ter alguém por perto que consiga orientar também é fundamental.
10. Para encerrar, qual mensagem o senhor deixaria para as mulheres que ainda adiam seus exames de rotina por medo, falta de tempo ou desinformação?
Resposta: Apesar de existir uma expectativa das pessoas que a mamografia, que o ultrassom, enfim, eles sejam preventivos no câncer, eles não são preventivos, eles são rastreamento. Então, não dá para culpar o exame por ele dar o diagnóstico. A gente precisa desse exame para conseguir fazer um diagnóstico mais precoce, para que o tratamento seja o mais tranquilo possível, com melhores resultados. Então, tumores, quando diagnosticados de forma mais avançada, demandam muito mais remédio, radioterapia, quimioterapia, enfim, tratamentos complementares, para garantir que você tenha um resultado adequado. Então, fazer o rastreamento possibilita o diagnóstico de lesões pré-câncer. São doenças precursoras e o tratamento delas, e permite o diagnóstico precoce também, para que você não precise fazer tratamentos mais agressivos, além de possibilitar você ter um resultado muito melhor com o tratamento que for implementado. Então, a culpa não é do exame, o exame é fundamental, mas ele não é preventivo, ele tem o objetivo de fazer um diagnóstico mais precoce possível, por isso que é muito importante que ele continue sendo feito.
E o segundo recado que eu vou deixar é para mulheres mais jovens, , que muitas vezes não fazem parte da população que faz o rastreamento habitual, então são essas mulheres abaixo de 40 anos, que quando percebem alguma alteração no autoexame ou que veem alguma coisa diferente na mama, procura ajuda. Não é porque tem menos de 40 anos que não é possível que aconteça algum tipo de câncer. Então se você percebeu qualquer alteração, busque ajuda, busque profissional, investigue essa alteração para evitar que ela seja maior e que seja mais difícil oferecer um tratamento adequado.




